quinta-feira, julho 28, 2022

Ganhei um calo a pensar no ambiente

Descobri um calo na mão. É de andar de trotinete, e foi logo agora que descobri que elas não duram nada e são más para o ambiente. Más ao ponto em que tenho de fazer um esforço activo para esquecer esse factoide que me ficou tatuado no pensamento. Vou ter de continuar a andar nelas mas talvez pense em enviar um email aos tipos da startup que as aluga para doarem qualquer coisa para a Amazónia. Lá no trabalho, uma pessoa pediu que se baixasse o ar-condicionado 1 grau em todos os andares para salvar o planeta. Pensei que assim também fodiamos o Putin, bem feita cabrão, eu tenho de ir de casaco para o escritório mas tu perdes a guerra. Quase como o Woody Allen meteu num filme há 40 anos, espero pelo dia em que Estudo de cientistas norte-americanos revela que afinal a opção mais ambiental é empanturramo-nos de chocolate e cigarros e andar como se entende, porque no fim tudo se auto-nivela, os grunhos continuarão a usar bidons de gasolina com rodas, os hippies betos andarão de Brompton, os gunas de Arroios de bicicleta. Tudo arde, tudo queima, pergunto-me se esta fase das notícias em que só ouço superlativos vai passar, se sou eu, se é da idade, se são os outros. Não fomos desenhados para lidar com tanta informação.

segunda-feira, julho 18, 2022

memória de elefante rico a fugir do fogo

Já há uns dias tinha notado qualquer coisa no tom com que uma notícia estava a ser dada no noticário da noite. Era sentida. Parecia pessoal. Casas perdem-se nos incêndios, tragédias pessoais acontecem, mas parece que há tragédias mais pessoais e tragédias mais trágicas. As pessoas perdem "tudo o que têem" e começam " a vida do zero" quando perdem as suas casas e eu seus cultivos, os seus animais. Mas há pessoas aparentemente diferentes destas, que perdem também a história da vida de família. Parece que para os jornalistas quem não tem uma casa grande e rica não tem "história". 

segunda-feira, julho 04, 2022

Almoço com os primos afastados

Os meus primos mais novos querem ir trabalhar. Estudaram pouco, arranham o inglês. Se fossem de Lisboa, auto-intitular-se-iam de "dropouts", diriam que a escola não os estimulava e não lhes dava valor. Que queriam ter mais controlo sobre as suas vidas. Queixavam-se da falta de oportunidades. Andavam a programar ou a fazer workshops. Compravam bitcoins. Fumavam tabaco aquecido.

Como são do campo, escapa-lhes auto-intitularem-se alguma coisa - os egos dão-lhes para terem carros com leds em baixo e estatuetas africanas no canto do quarto - limitam-se a procurar o que lhes parece o maior ordenado possível e que lhes oferece a ilusão do controlo das suas vidas. Em relação à geração anterior à deles, a única vantagem estratégica que ganharam foi ter acesso ao trabalho de outros países. O que não estava à espera é que usassem essa vantagem para tentar ir trabalhar para armazéns distópicos e apanhas-do-morango que soam sempre a esclavagismo moderno.

Como são do ramo meio salazarista da família, cheira-me que não vão tirar vantagens de nenhum sindicato.