quarta-feira, abril 26, 2023

25 de Abril com cheiro a Bolsoasno

A empregada doméstica de cá de casa é brasileira. Veio para Portugal com uma história de vida trágica. Tem a ajuda de muita gente à volta dela.
Infelizmente é bolsonarista.
Uma visão do mundo que não é muito compatível nem com o portugal inventado  nem com o Portugal real onde vive.
O portugal inventado é, como chamam no brasil, o do "Tio do Zap", o que é construido de memes no whatzapp pela máquina de propaganda habitual. Cá também temos esse, construido pelo Chaga. No Portugal do Tio do Zap, Portugal é simultaneamente violento e um paraíso onde não existe a violência do Brasil. Ganha-se muito mais mas nunca se foi tão explorado. Há emigrantes a mais mas só dos emigrantes errados. Vive-se numa Venezuela eterna, mas no entanto vêm para cá à procura de uma vida melhor. As contradições são óbvias mas soam a indignação, e indignação é tudo o que é preciso. Algo está mal e tem de mudar, nem que seja pelas razões erradas.
A empregada bolsonarista veio cá no feriado. Mas trouxe o marido para ajudar. Com uma condição: ninguém pode ver o marido a limpar a casa.
Por isso lá fomos à marcha na Avenida da Liberdade. Para respeitar o desejo do marido para que a possa ajudar. Meio indignado, mas lá fui festejar a liberdade.

segunda-feira, abril 10, 2023

Tenho uma reclamação II

Sobre o fenómeno que vou descrever, primeiramente questionei-me se este fenómeno não seria culpa minha. Mas entretanto percebi que quando chego a qualquer balcão e peço algo mais do que o que pretendo, esse detalhe faz o que seria uma mera transacção tornar-se num favor. Para usar um exemplo que toda a gente entenda, imaginemos ir comprar um livro e não nos lembrarmos do nome exacto do livro. O único livro que não me enganarei a comprar é a Biblia - Esse é o único livro que toda a gente sabe o nome sem margem de erro - Se chegar a um livreiro com um nome aproximado de um livro,  já estou implicitamente a pedir um favor: que ele me venda livros é um dado adquirido, mas perceber que livro estou a tentar referir-me, é um favor que me faz.

É ainda importante ter em conta que este caso - não ter a certeza do nome correcto de algo - é muito comum em português. O português é uma lingua bastante limitada na definição de objectos, parece-me. É algo que me atormenta com frequência. O Acordo Ortográfico chateia-me, as pessoas que reclamam do Acordo Ortográfico chateiam-me ainda mais, o Acordo Ortográfico não ter resolvido esta falta de palavras ainda me chateia mais ainda mais mais ainda. Exemplo: Como é que chamam um esfigmómanometro senão aparelho-de-medir-a-tensão? Parece que só os objectos ingleses têm nomes exactos e bons, daqueles que o google conhece.

A vaca fria chega quando vou transaccionar algo que tenha uma função menos conhecia, concreta ou passível de ser descrita sucintamente. Experimentem encontrar o nome de uma peça da máquina de lavar responsável por ligar duas partes que têm uma dobradiça de plástico branco segura por um eixo curto com 3 centimetros e que deixa a máquina desligar-se quando o temporizador actua sobre ela. Estarão a pedir um grande favor a um canalizador, que ele se recusará a fazer. E rapidamente chegarão à conclusão que o desporto favorito de qualquer português que esteja atrás de um balcão é provar que os outros estão errados.

segunda-feira, março 27, 2023

Tenho uma reclamação I

Até há pouco tempo, pensava que o que mais nos definia como um povo era sermos deprimidos. O português é muito deprimido. Especialmente se estiver ao lado de outros povos. Por contraste, a diferença torna-se muito mais óbvia. Somos menos expansivos, muito calados, muito cientes do perigo que é falar demais e deixar pratos limpos. Queimar pontes é impensável. Até que há dias mudei de ideias, sermos deprimidos é o menor dos males.

Pensava isto porque sou confrontado com isto todos os dias, a trabalhar com portugueses e estrangeiros no mesmo sítio.

Até que há dias, numa sala de espera de um hospital, ouvi alguém a ser atendido com maus modos quando estava apenas a fazer uma pergunta e reconheci um tom familiar, que tinha ouvido no dia anterior, num restaurante. O empregado insistia que já tinha dito que não tinha pudim flan. Isso fez-me lembrar que tinha apanhado quase o mesmo diálogo na semana anterior no café. No dia antes, também, mas com o canalizador que insistia que eu devia saber explicar-lhe como ligar a máquina da louça à parede.

Gostamos de provar que os outros estão errados, é isto.



segunda-feira, novembro 07, 2022

O Websummit já passou

Nada de importante sai do websummit. Podem tirar as piadas todas, o gozar com os anglicismos e as manias, a Cristina Ferreira e a sua missão insondável de mostrar a todos que não tem problemas em não praticar inglês o suficiente para ir para um palco, os discursos batidos, as apps, a technologia que não serve para quase nada. Mesmo sem o gozo, não sai nada de lá. É como um gigantesco press-release de 2000 páginas. Podiam estar lá os Panamá Papers. Podia ser a cura para o cancro. Ninguém quer saber. Tudo o que sai de lá são os pequenos soundbytes dos políticos que vão ao palco. Só porque o palco é grande.

quinta-feira, outubro 06, 2022

Tenho aqui uma teoria antiga

Hoje lembrei-me de 2 cidadãos do mundo que conheço. Um tipo português que só anda com mulheres estrangeiras e um tipo estrangeiro que só anda com mulheres portuguesas. Eu acho que estes gajos já devem ter percebido que não devem dizer nada de jeito na sua lingua de origem.